Direito Bancário

Elaborado por Emilio Mavie

EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO BANCO

Antiguidade

Na Babilônia, Egito e Fenícia a prática do empréstimo em dinheiro era comum, desde o século VI a.C. No entanto, apenas na Grécia e em Roma muitas operações do banco moderno surgem, como o depósito de moeda e de valores, empréstimo à juros, etc. O templo dos deuses era o principal local de realização das operações bancárias. Os “trapezistas”, na Grécia, e os “Argentari”, em Roma, eram os responsáveis por realizar as trocas, depósitos e empréstimo de moeda. (ABRÃO, 2016).
 Idade Média
Com o avanço do comércio, principalmente nas feiras italianas, aparecem os campsores que realizavam a troca de moedas, e, posterirormente os mesmos ficaram conhecidos como banqueiros, uma vez que passaram, aceitar depósitos de moedas e, em troca, concediam um certificado. (HISTÓRIA, 2016). Na Itália, aplicava-se juros no recebimento de empréstimos forçados. O Banco da Itália que começou a realizar empréstimo compulsórios foi o de Veneza, fundado em 1171. A Casa di San Giorgio, Gênova, fundada em 1408, foi a primeira sociedade anônima constituída. Com o surgimento de grandes instituições que actuavam em outras regiões fora da Itália, principalmente a partir da Revolução Industrial, solidificaram e expandiram a prática dos banqueiros. (ABRÃO, 2016).

  Idade Moderna
As expedições marítimas, a intensificação do tráfico mercantil, o aumento das feiras e de metais preciosos, levaram, consequentemente, ao aumento da necessidade do Estado de obter crédito. Isso alterou o papel dos bancos, que deixaram de apenas cobrar, pagar e realizar o câmbio, para, também, realizar a intermediação de crédito, isto é, pegar o crédito e o fundo monetário dos depositantes e distribuir aos demais clientes. Com isso, houve aumento da quantidade de bancos na Itália, França e Alemanha. A Revolução Industrial lançou as bases do capitalismo liberal. No século XIX os bancos atingiram o seu apogeu, uma vez que sua actividade tomou dimensões globais, que, no século XXI, com o avanço tecnológico, propiciou maior expansão da actividade no campo internacional. (ABRÃO, 2016).

 Definição De Banco
Banco, segundo Nelson Abrão (2016) “é a empresa que, com fundos próprios ou de terceiros, faz da negociação de créditos sua actividade principal, de onde se dessume competir-lhe, dentro de suas prerrogativas profissionais, também o exercício das acessórias, que, não se contendo dentro das creditícias, atendem à finalidade de atrair o cliente para elas”. Destarte, uma vez que o banco trabalha com fundos de terceiros, sendo visível sua actividade de captação, no momento actual, a principal distinção entre banco e instituição financeira, de maneira geral, está no fato de que aquela cria a moeda escritural. (ABRÃO, 2016).
  

Noção Preliminar

O direito bancário é um conjunto de normas e de princípios jurídicos que suscitam o predicativo “bancário”. Além disso, a expressão designa a disciplina jurídica que estuda essas mesmas normas e princípios.
As instituições de crédito e as sociedades financeiras submetem-se a regras de densidade crescente. Fala-se, a tal propósito, num sistema financeiro. O direito bancário regula e estuda duas grandes áreas.
  • A da organização do sistema financeiro: debruça-se sobre os bancos e demais instituições, as condições de acesso à sua actividade, a suspensão e a fiscalização e as diversas regras conexas.
  • A da actividade das instituições de crédito e sociedades financeiras: tem a ver com as relações interbancárias e com as relações que se estabeleçam entre a banca e os particulares.
Ao direito da organização do sistema financeiro, chamar-se-á direito institucional; paralelamente o direito bancário material, será o direito da actividade das instituições de crédito e sociedades financeiras ou, se se quiser, o direito da actividade bancária, altamente entendida.

Direito bancário institucional

Corresponde à disciplina do sistema financeiro ou, substancialmente: das instituições especializadas no tratamento do dinheiro. Pode-se reportar o direito bancário institucional ao regime do Banco de Portugal e ao das instituições de crédito e das sociedades financeiras, tal como resulta do Regime Geral das Instituições de Crédito.

Direito bancário material

O direito bancário institucional tem, uma autonomia clara, dada pela especificidade do seu objecto – as operações relativas ao dinheiro – e pela afirmação das suas fontes. No entanto, a área mais estimulante e decisiva do direito bancário é a do direito dos actos bancários, isto é, do direito da actividade das instituições de crédito e sociedades financeiras, no seu relacionamento com os particulares, a que se chama direito bancário material.
Este é à partida, um direito contratual ou um direito de (determinados) contratos comerciais: ele submete-se ao direito das obrigações, com os desvios ditados pela natureza comercial dos actos em causa e, ainda, com as especificidades propriamente bancárias, que tenham aplicação.

Princípios bancários privados

O direito bancário deve o seu crescimento recente à incapacidade do direito privado tradicional, civil e comercial, de acompanhar o desenvolvimento da actividade económica subjacente: a actividade bancária.
Nos seus aspectos processuais e dinâmicos, pode-se considerar o direito bancário privado como dominado por um princípio da simplicidade. Este princípio resulta de diversos sub-princípios, ou princípios mais explícitos:

a) A desformalização: os actos bancários surgem sem especiais formalidades;

b) A unilateralidade: os actos bancários completam-se, muitas vezes, apenas por simples cartas, assinadas pelo cliente, dispensam-se, assim, as clássicas propostas e aceitação;

c) A rapidez: o giro bancário não se compadece com negociações complexas ou com tempos de espera;

d) A desmaterialização: fortemente apoiado na informática, o direito bancário lida, cada vez mais, com valores e representações desmaterializadas.
No tocante à regulamentação proporcionada, o direito bancário encaminha-se para um modo próprio de gerir as realidades sociais, e que fica algures entre a materialidade subjacente e a tutela da aparência. 

Pode-se falar num princípio da ponderação bancária, que resulta dos seguintes vectores:

a) A prevalência das realidades: no dever de informação como na preparação de certos negócios mais complexos, o banqueiro não vai atender à regularidade formal dos actos, ele descerá à substância económica da situação;

b) A abrangência: o direito bancário tende a gerar negócios ou actos em cadeia, raramente se contentará com actos isolados;

c) A flexibilidade: o direito bancário é fortemente responsivo no sentido de enfrentar problemas novos, com soluções diferentes;

d) O primeiro entendimento: perante actos jurídicos correntes, o direito bancário dará primazia ao primeiro entendimento que deles resulte; há como que uma tutela da aparência, em moldes particulares.
No tocante a sanções, o direito bancário aponta para um princípio da eficácia.




ACTUAÇÃO DO DIREITO BANCÁRIO

O Direito Bancário regula a actividade praticada pelos bancos. Sendo assim, a importância do Direito Bancário se revela nos reflexos da actividade bancária na sociedade. Por isso, o Estado tem que assegurar o controle da referida actividade. Os bancos desempenham um papel necessário de intermediários nos pagamentos. Com o avanço tecnológico, há serviços contínuos que permitem os clientes acessarem a sua conta através do celular e em qualquer parte do planeta e, consequentemente, há maior necessidade de garantir a segurança e redução das fraudes. Efetivamente, os bancos modelam os negócios, realizando as operações com propósitos de obter lucros e permitir um desenvolvimento do crescimento da economia. (ABRÃO, 2016).



É importante salientar que no Direito Bancário as mudanças ocorrem de modo dinâmico, devido a conjuntura económica, uma vez que o mesmo visa regulamentar a organização do sistema bancário e financeiro, a actividade e as instituições de crédito e sociedades financeiras. Isso significa que o Direito Bancário estabelece as condições de acesso à actividade bancária, sua fiscalização e as regras sobre a matéria. (SANTIAGO, 2016).
 
  
Características do Direito Bancário
 
1) Direito privado
O direito bancário é direito privado. O qualificativo público ou privado não cabe a normas isoladamente tomadas, mas apenas a sistemas ou subsistemas – uma mesma regra pode ser pública ou privada, consoante a sua inserção (uma obrigação pecuniária, por exemplo, será pública se corresponder a um dever tributário; será privada quando preencha um mútuo).
Direito bancário material é privado: assenta em contratos comerciais, em cláusulas contratuais gerais e na autonomia das partes.
Direito bancário institucional é privado: nasceu como direito público e ainda hoje postula poderes dele derivados (supervisão ou fiscalização por poderes públicos).
2) Direito funcional específico
O direito bancário não é valorativamente neutro. Este acompanha a lógica do dinheiro e da sua circulação. Os seus vectores e as suas soluções empenham-se na salvaguarda do valor da moeda e dos créditos a ela relativos, bem como no fenómeno do lucro.
3) Direito técnico
O Direito bancário pode ser apresentado como direito técnico. A expressão tem alguma ambiguidade – poderia exprimir uma de duas ideias:
          - a de que o estudo e aplicação implicariam conhecimentos de técnica bancária;
          - a de que o direito bancário exige um estudo especializado.
Tal ideia é redutora, pois uma aplicação sábia implica o conhecimento da realidade subjacente.
4) Direito fragmentário e dependência científica
O Direito bancário tem natureza fragmentária, embora encontremos alguns institutos que dispõem de regimes bastante completos, como o regime do Banco de Moçambique.
Para além disso, recorre-se a institutos civis ou comerciais preexistentes, cuja regulação acolhe na íntegra, introduzindo depois algumas especificidades.
  
Interpretação e aplicação do Direito Bancário
 
Na interpretação e na aplicação do Direito bancário há que ter presente as regras gerais, tal como apuradas na actualidade pelo Direito civil.
Em traços gerais, podemos considerar que os cânones de interpretação correspondem aos fixados por Savigny no séc. XIX – letra, espírito e vontade da lei e legislador.
Para além disso, a função de realizar o direito é vomitivo-cognitiva, onde acresce aos factos e à lei, temos a escolha humana aplicado, baseada em múltiplos factores normativos. Assim, o intérprete deve ponderar o elemento sistemático (a norma faz parte de um sistema) e teleológico (os comandos valem como instrumentos para alcançar uma ordenação de valores e de interesses).
 
O Direito bancário assume uma natureza funcional específica – para além do Direito comum, ele está envolvido na problemática do crédito e do dinheiro, cabendo-lhe salvaguardar os valores subjacentes. Esta dimensão poderá ter consequências interpretativas: as fontes bancárias deveriam ser interpretadas num sentido conducente à realização óptima da sua função.
Contudo, o Direito bancário apresenta áreas diferenciadas (por ex.: a contratação onde está em causa a tutela do consumidor de produtos financeiros), cabendo, por isso, ao intérprete posicionar dentro do subsistema jurídico bancário, o problema que se lhe depara

Conceito dos contratos bancários

As operações bancárias se dão por meio dos contratos bancários. O contrato bancário, como todo contrato, é um fato jurídico. E dentro do género fato jurídico, normalmente é enquadrado especificamente como negócio jurídico. Deste modo, dentro do âmbito das operações bancárias, os contratos bancários funcionam como seu esquema jurídico, como fato jurídico propulsor da relação jurídica obrigacional bancária, engendrando direitos subjectivo e deveres jurídicos.
Conceituar contrato bancário implica dar-lhe sua nota essencial, suficientemente restrito para o distinguir dos demais contratos civis e comerciais, e suficientemente amplo para abarcar todas as actividades historicamente incluídas no rol bancário. É tema árduo pois, em essência, reflecte dificuldade de mesma natureza daquela que sempre se encontrou para distinguir os contratos comerciais dos civis, porém agora mais avante, para distinguir contratos bancários dos comerciais e civis.
Não há unanimidade entre os autores. Sérgio Carlos Covello  localiza a questão afirmando que se podem adotar dois critérios fundamentais na conceituação dos contratos bancários: 
1) o critério subjectivo, sendo contrato bancário aquele realizado por um banco; 
2) o critério objectivo, pelo qual é contrato bancário aquele que tem por objecto a intermediação do crédito.
Os dois critérios sozinhos são insuficientes, como nota o autor: o primeiro porque o banco realiza contratos que não são bancários, como de locação, prestação de serviços, bancários, etc; o segundo porque o particular também pode realizar operação creditícia sem que se configure como bancária. Adopta, então, uma concepção sincrética, recorrendo aos dois critérios, para conceituar o contrato bancário como "[...] o acordo entre Banco e cliente para criar, regular ou extinguir uma relação que tenha por objeto a intermediação do crédito." 
Dornelles da Luz adopta a definição de contrato bancário de Garrigues, como um "[...] negócio jurídico ‘concluído por um Banco no desenvolvimento de sua actividade profissional e para a consecução de seus próprios fins económicos.’"  Adopta o autor o critério subjectivo para definição, incluindo as actividades de prestação de serviços bancários que no conceito objectivo-subjectivo de Covello restavam excluídas.
 A exigência do critério objectivo por Covello, deste ângulo, torna-se excessiva, pois exclui do rol dos contratos bancários actividades historicamente incorporadas pelos bancos em sua evolução, que são os contratos de prestação de serviços como o de caixa de segurança, custódia de bens, operações de cobrança, etc. Realmente estes contratos, que não raro vinculam-se às operações de crédito de modo acessório, parecem ter adquirido notas e peculiaridades de modo a merecerem o tratamento especial das normas bancárias.
Se, por um lado, a conceituação meramente subjectiva não é suficiente, como pontuara Covello, pois o conceito englobaria contratos realizados pelo banco de natureza evidentemente não bancária (como de trabalho, locação, compra e venda, etc.), por outro lado, a solução científica também não parece residir em seu critério objetivo. Parece, sim, adequada, a utilização do critério subjetivo com um "plus", sendo contrato bancário aquele em que o sujeito banco actua como comerciante, no exercício da mercancia enquanto profissão habitual (excluindo-se os contratos sem as notas da habitualidade, profissionalidade e comercialidade).

Neste sentido se direciona Rodrigues Alves, após criticar a conceituação com base no critério puramente subjectivo: "[...] em verdade, há operação bancária se existe suporte fático que se traduz empiricamente em actividades nas quais o banco opera com o cliente, atendendo-se ao fim comercial do banqueiro."

Natureza Jurídica
Fabio Ulhoa Coelho afirma serem os contratos bancários essenciais para o concreto desempenho da intermediação de recursos monetários realizada pelas instituições financeiras, caracterizadas, de forma genérica, pelas operações passivas ou activas das referidas instituições. As actividades realizadas pelas instituições financeiras se restringem às operações relacionadas à concessão e obtenção de recursos financeiros, bem como às outras modalidades de prestação de serviços, caracterizando a natureza jurídica dos contratos bancários pela bilateralidade sinalagmática das relações constituídas entre as partes.
Os contratos bancários, por possuírem essa diversidade financeira operacional, restringem a autonomia da vontade das partes ao controle contábil característico do Sistema Financeiro Nacional e demais normas, que visam a protecção dos direitos recíprocos entre as partes. Cabe ressaltar que tais controles auxiliam as relações constituídas por intermédio dos contratos bancários, vez que as regulamentações financeiras, civilistas, a jurisprudência e o próprio mercado, permitem que seja estabelecida a reciprocidade dos ônus e vantagens entre as partes, voltando estas ao estado equânime.
A título de exemplificação, cumpre informar que há contratos bancários que estipulam regramentos específicos sob os quais a parte contratante se obriga. Esses contratos são denominados como “contratos de adesão”, que limitam a autonomia da vontade relacionada a parte que se obrigou às cláusulas formuladas antecipadamente pelas, em continuidade ao exemplo, instituições financeiras.

Classificação dos contratos bancários

 Posto o conceito de contrato bancário, cumpre classificá-lo. Há diversas classificações dos contratos bancários, sendo a primeira e mais importante a que os divide em contratos bancários típicos e contratos bancários atípicos.
Os contratos bancários recebem o adjectivo típico quando se realizam para o cumprimento da função creditícia dos bancos (operação bancária típica, de crédito), e quando típicos se subdividem em activos e passivos, conforme assuma o banco, respectivamente, a posição de credor ou devedor da obrigação principal. São atípicos os que o banco realiza para prestação de serviços (operação bancária atípica).
Contudo, há também uma terceira classe de contratos, notada pelo mestre Dornelles da Luz (ignorada pela grande maioria dos autores), que é uma categoria mista entre típicas e atípicas, sendo operações que envolvem créditos e serviços, e que assumem caracteres próprios que as distinguem das outras duas categorias.
Duas espécies de obrigações costumam permear os contratos dos bancos múltiplos: de dar e de fazer. Os contratos típicos, isto é, de crédito, armam-se em estabelecer obrigações de dar dinheiro (moeda). Já os contratos atípicos, isto é, de mera prestação de serviços, contêm obrigação de fazer que vincula o banco. E nos contratos mistos, que envolvem créditos e serviços, como intermediação bancária no pagamento (pagamento e cobrança), intermediação bancária na emissão e venda de valores mobiliários, e no crédito documentário, assume o banco obrigações de fazer (prestação de serviço no recebimento e/ou pagamento de terceiro), as quais têm inerentes obrigações de dar, sendo a obrigação primeira e principal a de fazer.
A definição que traz Rodrigues Alves da operação bancária, a qual parece acertada, não exclui do âmbito desta as actividades bancárias secundárias. Enquanto as actividades principais concernem ao recolhimento e distribuição do capital, as secundárias aparecem quando o banco age na função que não lhe é típica, ou seja, que não é a intermediação na circulação do dinheiro. Nas actividades secundárias também podem estar presentes os interesses bancários, de modo mediato, constituindo-se meio para a realização da actividade principal, v.g., através da captação de clientela.
Covello, em consonância com sua definição de contrato bancário, não traz a classificação em contratos bancários típicos e atípicos. É claro, porquanto, em sua definição, submeteu os contratos a um requisito objectivo muito estrito, restritivo, para que se configurem enquanto bancários. Só são bancários os que versam sobre o crédito. Deste modo desaparece a figura do contrato bancário atípico.
A actuação bancária se desenvolve, na sua esmagadora parte, em importância e quantidade, sobre os contratos típicos. Estes, como mencionado, podem ser activos e passivos, conforme o banco assuma, respectivamente, posição de credor ou devedor da obrigação principal, isto é, o pólo activo ou passivo. As operações passivas têm por objecto a captação de recursos junto à colectividade, pelo banco, dos quais necessita para processar sua actividade. Já nas operações activas os bancos concedem crédito aos clientes com recursos arrecadados de outros clientes mediante as operações passivas.

 Características dos contratos bancários
O contrato bancário tem peculiaridades que justificam sua disciplina diferenciada. Com efeito, como nota Orlando Gomes, "Os esquemas contratuais comuns, quando inseridos na actividade própria dos bancos, sofrem modificações sob o aspecto técnico, que determinam alterações em sua disciplina."
As características do contrato bancário, muito relacionadas umas com as outras, podem ser assim pontuadas:

 Instrumento de crédito
O contrato bancário é instrumento de operação de crédito. O contrato bancário, em sua grande maioria, é de crédito, e daí assume várias outras características, decorrentes desta, apontadas por Covello: 
1) envolve confiança, pois de um lado o banco averigua a vida do cliente, e de outro deve haver rígido controle do Poder Público sobre a instituição financeira, vindo esta a inspirar a confiança da coletividade; 
2) envolve prazo, que é o tempo que medeia prestação e contraprestação (esta é diferida, e não imediata); 
3) envolve juro ou interesse, que é o preço de cada unidade de tempo em que se dilata o pagamento de um crédito; 
4) envolve risco, inseparável da operação de crédito, seja risco particular (relativo a uma pessoa ou operação), geral (relativo a acontecimentos gerais que envolvem toda a nação ou até várias nações) ou corporativo ou profissional (relativo a um sector, uma classe ou uma profissão qualquer);

 Rígida contabilidade
O contrato bancário implica rígida contabilidade. Todos os contratos bancários, em função de em sua maioria lidarem com o crédito (pecuniaridade), são rigorosamente contabilizados, o que permite o controle da actividade bancária. Afirma Rizzardo que há a "[...] contabilização de todos os valores que ingressam e saem do banco, com a escrituração, de modo a não permitir margem de dúvidas quanto ao seu montante, ao vencimento, aos encargos inerentes e às amortizações."
Os assentos de contabilidade, segundo Covello , são anotações que permitem comprovação imediata da operação realizada, porque os contratos bancários não podem ficar circunscritos aos esquemas tradicionalmente seguidos nas matérias civil e comercial. Tais anotações são de indiscutível valor probatório, dada a escrupulosa contabilidade bancária e a presumível imparcialidade. Adverte Covello que, "Como assevera Garrigues, ‘os Bancos não realizam anotações em seus livros com fins de prova, e, por outra parte, uma contabilidade que não fora correta seria praticamente impossível de suportar, pois qualquer artifício ou alteração repercutiria no conjunto do sistema’."

 Complexidade estrutural e busca de simplificação
O contrato bancário revela uma complexidade estrutural e busca simplificação. A complexidade é, para Rizzardo, "[...] outra nota das operações bancárias, em razão do surgimento constante de novas relações económicas entre o banco e os usuários, exigindo operações cada vez mais sofisticadas e complexas, não apenas no sentido de actualizar a escrituração, mas de acompanhar as contínuas modificações que ocorrem no mundo dos negócios."
Devido a esta complexidade grande, e a serem realizados em grande escala (em massa), coloca-se a busca por uma simplificação dessas operações, despontando isto também como característica. É neste sentido que se adoptam documentos e títulos de crédito pelos quais se substitui o controlo de uma situação jurídica material pelo de uma situação jurídica meramente formal.

 Profissionalidade e comercialidade
O contrato bancário é realizado com profissionalidade e comercialidade. Outra característica é a profissionalidade , pois exerce o banco tais contratos como profissão. E mais, é actividade comercial  (bancária como espécie, mas comercial como género – afinal, a actividade bancária é uma especialização da comercial), sendo tais contratos atos de comércio, até por cominação legal. Sua actividade envolve intermediação, habitualidade e lucro. Esta característica, como já se notará em oportunidade posterior, permite a aplicação das normas comerciais em derrogação parcial das civis.

 Informalidade
No contrato bancário prevalece a informalidade. Quanto à forma, como assevera Pontes de Miranda, "Não há resposta ‘a priori’ às questões. A forma é a que tem de ter a espécie de negócio jurídico."
Sabe-se que normalmente não se exige que a forma integre necessariamente a substância do ato. É o que afirma Dornelles da Luz. Para este, "Aliás, a informalidade crescente dos contratos do mercado financeiro é uma característica da actualidade, a maior parte dos quais materializam-se em fichas gráficas. A informatização e o uso do telefone têm propiciado movimentação de contas, aplicações em papéis. A agilidade do mercado financeiro e o alto grau de concorrência têm produzido essa inovação."
Arnoldo Wald afirma que o Direito Bancário contemporâneo tem por características a padronização, utilização da informática e formalismo. Mas utiliza o termo "formalismo" no sentido de "fôrmas", pois os contratos bancários são realizados padronizadamente, sendo contratos de adesão. Ressalta que os mecanismos utilizados são "rápidos, simples e seguros", destacando o importante papel que os computadores têm realizado ultimamente.

Sigilo
Há como dever intrínseco ao contrato bancário o dever jurídico de sigilo. Outra característica, ressaltada por Covello , é o carácter sigiloso dos contratos bancários. O banco assume informações confidenciais no trato com os clientes, sendo-lhe imposto o dever de discrição, sigilo. É verdadeiro dever jurídico de sigilo profissional.
Várias teorias procuram explicar o carácter sigiloso. A contratual afirma surgir do contrato, pois certas disposições, mesmo que não expressas, se pressupõem, como a do sigilo bancário se pressupõe frente à estrutura da operação bancária. É teoria bastante aceita, reforçada pela tese de que no contrato bancário estão os elementos do contrato de mandato, devendo o banco mandatário agir com diligência e discrição.

 Contrato de massa
O contrato bancário é um contrato realizado em massa. O banco realiza operações em massa, a um grande número de clientes indistintamente. São milhares de contratos firmados diariamente, o que gera uma padronização do contrato, estes passam a ser "produzidos em série", em massa, para uma sociedade de consumo que cada vez mais faz uso das operações creditícias. O atendimento a um sem-número de clientes gera a uniformização do contrato, ao qual o cliente simplesmente adere. É, pois, um contrato de adesão, característica que será analisada no próximo item.

 Contrato de adesão e formulário
O contrato bancário é contrato de adesão e formulário. A partir do momento em que o banco passou a atender a uma infinita sequência de operações, tornou-se inviável a elaboração de um contrato para atender cada relação contratual. Deu-se, então, a necessidade da elaboração de minutas, idênticas, formuladas com antecedência, isto é, passaram os contratos a serem pré-determinados, assumindo uniformidade, bem como por isso passam a ter suas cláusulas impostas unilateralmente, não sendo conferida à outra parte a possibilidade discuti-las.
Conforme afirma o ilustre professor Alfredo de Assis Gonçalves Neto, quanto maior a empresa (organização dos factores de produção por parte do empresário para exercer uma actividade económica), mais o empresário se distancia da engrenagem que produz resultados. O grande empresário, em sua actividade em cadeia, uniforme, actua pelas diretrizes que dita aos seus prepostos, assim se justificando o surgimento dos contratos formulários. O contrato bancário é formulário e de adesão.
Leciona o mestre que a distinção entre contratos de adesão e formulário, embora irrelevante para muitos, encontra sustentação de outros. Para estes, "[...] o contrato de adesão seria o contrato formulário decorrente de uma actividade exercida sob regime legal ou virtual de monopólio ou de oligopólio."  As actividades dos bancos estão sob rígido controle estatal, e dependem de autorização administrativa. Este sistema originou um ". mercado cativo, à semelhança de um clube fechado cujo acesso só é permitido a quem tem cacife e influências.
Elucida Covello  que nos negócios jurídicos bancários a padronização atinge tal nível que passaram a se dar por condições gerais.  Na evolução histórica dos bancos, as condições gerais se deram primeiramente num plano individual, tendo cada banco suas próprias condições, quando ainda não havia iniciativa dos círculos oficiais. Com o tempo, as condições se tornaram uniformes para todos os bancos, padronizando-se os formulários, por dois motivos: experiência de longos anos de trato com a clientela e desejo de eliminar a concorrência. Os bancos, em suas associações profissionais entabularam condições e se obrigaram a respeitá-las nas relações com os clientes.
Nota Orlando Gomes que a conceituação dos contratos de adesão é difícil, pois conforme a teoria que o explique, assume contornos diferentes (há, pelo menos, seis modos de caracterizá-lo). Para o autor, "O traço característico do contrato de adesão reside verdadeiramente na possibilidade de predeterminação do conteúdo da relação negocial pelo sujeito de direito que faz a oferta ao público."
Segundo os que continuam defendendo a tese contratualista para explicá-lo (pois há quem negue seu caráter contratual), "[...] o contrato de adesão é um novo método de estipulação contratual imposto pelas necessidades da vida econômica. Distingue-se por três traços característicos: 
1) a uniformidade; 
2) a predeterminação; 
3) a rigidez."  A primeira é exigência da racionalização da actividade económica. A segunda é a que o caracteriza com mais vigor. A uniformidade, sem predeterminação, não basta. A terceira é desdobramento das outras duas.
Nos contratos de adesão ocorre o confronto entre uma parte, mais forte economicamente (conglomerados, empresas oligopolizadas, monopólios), que domina e mantém cativo o mercado, e uma parte fraca, que não tem qualquer condição de fazer imposições frente a um corpo pré-estabelecido de cláusulas fechadas, restando-lhe apenas a alternativa de aceitá-las ou rejeitá-las em bloco. Contudo, muitas vezes, nem esta alternativa resta à parte, que necessita de bens e serviços para prover e desenvolver sua vida. Não há também que dizer de optar por outras empresas, quando estas se organizam, no dizer do professor Assis, "[...] unidas por formas disfarçadas de inconfessáveis cartéis (mantidos à sombra da tolerância e da inércia do Estado)."

Assim, como nota Arnaldo Rizzardo , coloca-se a parte fraca frente a cláusulas que muitíssimas vezes sequer lê. Se lê, não as entende. Se entende, e discorda, de nada adianta, pois não as pode alterar. E, como observado, fica entre aceitar ou rejeitar em bloco, sendo esta liberdade de escolha em vários casos ilusória, porque o autor da oferta goza de um monopólio, e a parte fraca tem necessidade do bem ou serviço.  Daí afirmar Dornelles da Luz  que se, a princípio, não há problema nos contratos de adesão, úteis e necessários, surgem os conflitos com o abuso de poder económico de sectores oligopolizados, mais fortes do que o aderente, o qual se subjuga e vincula frente à falta de alternativas concorrentes.
Em virtude disso tudo é que muitos autores, segundo Orlando Gomes , contestam a natureza contratual da figura do contrato de adesão. Saleilles, pai da expressão "contratos de adesão", já no início do século afirmava que de contrato tinha apenas o nome. Não obstante, esclarece Gomes:

Entende a maioria, porém, que apesar de suas peculiaridades, devem ser enquadrados na categoria jurídica dos contratos. Origina-se a dúvida na confusão a respeito do elemento que define o contrato. Deve-se distinguir, com Carnelutti, o concurso de vontades para a formação do vínculo e a regulamentação das obrigações oriundas desse vínculo. O concurso de vontades é indispensável à constituição dos negócios jurídicos bilaterais, dos quais o contrato constitui expressão mais comum. Por definição, o contrato é o acordo de duas vontades. Não se forma de outro modo. Já a regulamentação dos efeitos do negócio jurídico bilateral não requer a intervenção de duas partes. Pode ser expressão da vontade de uma com a qual concorda a outra, sem lhe introduzir alteração. A regulamentação bilateral dos efeitos do contrato não é, enfim, elemento essencial à sua configuração. Por outras palavras, a circunstância de serem as obrigações estatuídas pela vontade predominante de um dos interessados na formação do vínculo jurídico não o despe das vestes contratuais. Afirma-se a contratualidade da relação pela presença do elemento irredutível, que é o acordo de vontades. No contrato de adesão não se verifica contratualidade plena, mas o mínimo de vontade existente no consentimento indispensável da parte aderente é suficiente para atestar que não é negócio unilateral. Prevalece, em consequência, a opinião de que possui natureza contratual."
Cumpre observar também que é cada vez mais volumosa a corrente a qual sustenta que o contrato de adesão não pode ser explicado como contrato. Para Paulo Lôbo , que está dentre os autores que entendem que a teoria do negócio jurídico não explica o contrato de adesão, o contrato evoluiu para além do negócio jurídico e de sua teoria. Insistir no negócio jurídico como categoria mais ampla e que abarca todos os contratos é um obstáculo epistemológico. Há um afastamento, explica o autor, em certos contratos, dos princípios fundamentais do direito privado (como a liberdade de contratar e o auto-regramento da vontade – autonomia privada), e a solução não está na ampliação dos conceitos, pois com a generalização cresce a imprecisão.
Dentro desse antagonismo é que sustenta o advogado Luiz Zenum Junqueira, em seu artigo "Natureza Jurídica do Contrato Bancário" , que "Efetivamente – é do conhecimento geral das pessoas de qualidade média – os ‘contratos bancários’ não representam natureza sinalagmática, porquanto não há válida manifestação ou livre consentimento por parte do aderente, com relação ao suposto conteúdo jurídico, pretensamente convencionado pelo credor."  Para Rizzardo, que cita Junqueira, "A vontade fica alijada de qualquer manifestação livre."
E, por óbvio, as conseqüências jurídicas de se considerar, ou não, os contratos de adesão como verdadeiros contratos, são distintas, o que repercute diretamente nos contratos bancários. Apenas como provocação, pois não se encontram referências neste sentido, e é tema que merece estudo, se os contratos de adesão, aí os bancários, não forem contratos propriamente ditos, não aparecerão como figuras diretamente tratadas pelo direito.

Tipos De Contratos Bancários
Os contratos bancários, como praticamente todos os tipos de contrato, podem ser agrupados de acordo com certas características comuns – e a mais básica das classificações refere-se à operação viabilizada pelo contrato, que pode ou não ser vinculada à natureza típica do banco.
 Contratos típicos e atípicos
Assim, temos os contratos típicos, que atendem à função de cumprimento das operações de crédito (típicas das instituições financeiras), ou atípicos, quando tratam de prestação de serviços realizados pela instituição. É possível constatar, ainda, a existência de uma terceira categoria, mista, envolvendo a prestação de serviços e operações de crédito, conforme atesta Dornelles da Luz.
Em se tratando de instituições bancárias, os contratos costumam se vincular à dois tipos de obrigações: de dar e de fazer. Contratos típicos, via de regra, estão vinculados à obrigação de dar dinheiro (moeda); quanto aos atípicos, estes tratam de obrigações de fazer às quais o banco se conecta indiretamente, como meio, por exemplo, de captar novos clientes. Observe-se que tais atividades, entretanto, constituem-se em secundárias para as instituições financeiras, já que a função de ser destas entidades (captar e intermediar valor monetário) é contemplada, principalmente, pelos contratos típicos.
A respeito dos contratos mistos verifica-se que que ambas as obrigações, de dar e de fazer, são contempladas (principalmente a de fazer). Dallagnol cita como exemplos de tais contratos: "intermediação bancária no pagamento (pagamento e cobrança), intermediação bancária na emissão e venda de valores mobiliários, e (...) crédito documentário".

 Contratos típicos: activos e passivos
São activos os contratos típicos nos quais o banco (ou instituição) assume posição de credor da obrigação principal; validam, no caso, a concessão de crédito das instituições financeiras aos clientes, obtidos, principalmente, das operações passivas. Nos contratos passivos, ao contrário, a instituição assume posição como devedor da obrigação, sendo fruto de colecta de recursos junto a outros clientes.
Contratos típicos, quanto à natureza
No tocante à natureza os contratos típicos (também chamados de contratos de crédito) podem ser classificados em públicos ou privados - sendo importante ressaltar que esta classificação se refere à fonte dos recursos, e não segundo o devedor, conforme lembra Dornelles da Luz.

O contrato de mútuo tem origem no direito romano, onde era denominado mutuum. Definia-se esta espécie como contrato pelo qual o mutuante (mutuo dans) transferia a propriedade de coisa fungível ao mutuário (mutuo accipiens), o qual se obrigava a restituir outra coisa da mesma espécie, qualidade e quantidade (ALVES, 1999).

Caracterizava-se como contrato real, unilateral e gratuito e tinha três elementos essenciais:

i) O acordo de vontades entre as partes, pelo qual o mutuário se obrigava a restituir a coisa;
ii) O objecto deveria ser coisa que se pesasse, medisse ou contasse e,
iii) A datio da coisa, ou seja, a transferência do direito de propriedade sobre a coisa (ALVES, 1999). Como era um contrato de direito estrito, o mutuário estaria obrigado a restituir somente coisa em igual espécie, quantidade e qualidade à que recebeu. Isso quer dizer que se houvesse estipulação de juros, o mutuário só estaria obrigado a pagar esses juros em esfera judicial, se além do contrato de mútuo houvesse sido celebrada uma stipulatio usurarum, caso contrário não haveria ação da qual o mutuante pudesse se valer para cobrar os juros (ALVES, 1999).

As noções de contrato de mútuo não mudaram muito e sua essência persiste até os dias de hoje. O Código Civil, trata em seu artigo 1142° e seguintes do contrato de mútuo, definindo-o como empréstimo de coisa fungível, no qual o mutuário, que é quem pega emprestado, obriga-se a restituir a coisa recebida, do mesmo gênero e qualidade. É um contrato que geralmente tem como objecto o dinheiro (maior exemplo de coisa fungível); é unilateral, posto que somente o mutuário contrai obrigações, qual seja, restituir a coisa; é temporário, pois tem um prazo para ser cumprido; e é real, posto que só se concretiza com a entrega da coisa ao mutuário (GOMES, 2002), permanecendo assim, com muitas características do direito romano.

Há que se dizer que o contrato de mútuo, na maioria das vezes, é gratuito, mas se forem fixados juros, torna-se oneroso e é denominado mútuo feneratício. Ademais, pode haver pagamento parcelado, ou seja, a dívida é amortizável (GOMES, 2002). Assim, no contrato de mútuo bancário, o mutuante é uma instituição financeira, que empresta o dinheiro a título oneroso, cobrando juros e obrigando o mutuário a restituir o valor emprestado, constituindo um mútuo feneratício.

Flávio Ferreira Neto (NETO, 2009, on-line), assim define o contrato de mútuo bancário: Contrato pelo qual o banco empresta ao cliente certa quantia de dinheiro. A matriz dessa figura contratual, evidentemente, é o mútuo civil, isto é, o empréstimo de coisa fungível (art. 1142° do C.C). Ganha, no entanto, esse contrato alguns contornos próprios quando o mutuante é a instituição financeira, principalmente no que diz respeito à taxa de juros devida. O contrato de mútuo bancário ou mercantil, não é solene, por isso não tem forma especial, devendo ser reduzido a escrito para fins probatórios. Geralmente se dá por meio de instrumento particular, mas pode-se adotar o instrumento público quando se fizer necessário, (ABRÃO, 2009).

OBJETO DO MÚTUO BANCÁRIO
O contrato bancário, segundo Covello, tem como objeto o crédito218, mas o mútuo bancário, espécie daquele, de acordo com Paulin, afirma que, diferentemente do mútuo em geral, cujo objeto pode ser qualquer bem fungível, o bancário terá como objeto dinheiro ou títulos fungíveis. O autor argumenta, além disso, que, “na maioria das vezes, a instituição mutua dinheiro. Deveras, em uma economia monetária, a quase totalidade das operações bancárias é cursada em moeda, que, diga-se de passagem, é a matéria-prima, por excelência, do banqueiro”. Não se deve esquecer, entretanto, de que ultimamente outros tipos de operações bancárias têm surgido no meio bancário. Operações não tão comuns no varejo, mas expressivas no atacado. É o caso das operações de mútuo de títulos. Atente-se, entretanto, que os títulos devem ser fungíveis.

CARACTERÍSTICAS DO MÚTUO BANCÁRIO

O mútuo bancário é um contrato real, unilateral e oneroso. É real porque “se aperfeiçoa com a entrega, pelo banco mutuante ao cliente mutuário, do dinheiro objeto do empréstimo”. Como se vê, não existe grande diferença no que tange à classificação dada ao mútuo civil, a não ser pela existência, no mútuo civil, da possibilidade de o mútuo ser gratuito. Por essa razão, não se fará, aqui, menção à onerosidade ou à unilateralidade – por já terem sido analisadas no capítulo primeiro –, passando-se, assim, a perscrutar as demais características que o distinguem do seu similar na seara cível.
Partes
Um contrato de mútuo bancário terá, de um lado, e necessariamente, uma instituição financeira e, no outro, pessoas físicas ou jurídicas em geral. O termo instituição financeira abrange as instituições bancárias e não bancárias; em alguns casos, a instituição financeira não atua isoladamente em uma operação de mútuo, mas sim em conjunto, geralmente por envolver valores elevados. A essas operações se dá o nome de empréstimos sindicalizados.
Actualmente o mútuo bancário se tornou uma rotina na vida das pessoas físicas e jurídicas, pois não existe restrição no acesso delas às operações de mútuo bancário, desde que se apresentem capazes para os atos da vida civil, quando não que estejam devidamente representadas ou assistidas.
Juros
Ao definir e conceituar o mútuo bancário, item 2.3, adiantou-se o que pode ser considerado como uma das principais diferenças entre o mútuo civil e o mútuo bancário. E a diferença não está no facto de que este pode ser oneroso, pois aquele também pode; ela está, sim, no aspecto remuneratório, já que para o mútuo civil existe limitação à sua incidência, se os valores forem fixados em patamares superior a oito ou dez por cento conforme exista ou não garantia real, poderá caracterizar-se como Usura (1.° de 1146° do C.C).
Os juros, vale lembrar, podem ter carácter moratório ou compensatório.

Serão compensatórios “aqueles devidos regularmente pelo mutuário, em retribuição à cessão transitória de recursos. Estes serão livremente pactuados entre as partes e constarão obrigatoriamente do instrumento de contrato. As partes podem acordar que estes encargos serão liquidados em parcelas ou em uma única ocasião. Optando pela liquidação em uma só vez, invariavelmente, os juros são satisfeitos, juntamente com o principal, ao final do prazo contratual”.

A estipulação de taxas de juros sobre um valor principal é conhecida como Usura e nunca foi bem aceita na sociedade. Na Idade Media, havia vedações religiosas à sua aplicação, foi nesta época que São Tomás de Aquino, criou princípios bíblicos que vedavam tais cobranças. Contudo, segundo Jairo Saddi (SADDI, 2007), o grande motivo por trás da proibição religiosa era que a Igreja, uma das maiores detentoras de riquezas e principal tomadora de crédito, não estava disposta a pagar mais caro pelo crédito obtido. No direito romano a prática da usura e do anatocismo (capitalização de juros), também eram repelidas, sendo permitido cobrar juros capitalizados apenas dos juros vencidos e não dos futuros.
O artigo 1146° do Código Civil, estabelecia que a taxa de juros estipulada ou o montante da indemnização exceder o máximo fixado na lei, considera-se reduzido a esses máximos, ainda que seja outra a vontade dos contraentes (n.3° do artigo 1146° do CC). Já os juros moratórios “são aqueles devidos em função do cumprimento a destampo da obrigação de pagar”.

Garantias
Ao praticarem operações de mútuo, as instituições financeiras o fazem de maneira profissional. Visando garantir a integridade de seus activos, tornam-se extremamente rigorosos na análise e viabilização de um crédito. Assim, a garantia se torna de relevância ímpar.

De tal sorte que, quanto maior o montante a ser mutuado, mais rigorosas são as análises das garantias, que se tornam variáveis conforme o caso concreto; algumas instituições financeiras priorizam garantias mais robustas, enquanto outras preferem garantias mais líquidas. Ressalte-se, nesse contexto, que “na concessão de crédito original, se a instituição financeira não se julgar confortável com a garantia oferecida, pode simplesmente não aprovar a operação, sem com isto criar nenhum risco a seus activos”, muito embora o crédito possa ser concedido sem garantias ou com garantias meramente simbólicas.
A garantia pode ser pessoal ou real. Dentre as garantias pessoais tem-se o aval e a fiança, sendo esta a mais usual em contratos de mútuo bancário, até mesmo pela relativa simplicidade de sua constituição.
Prazo
Se o prazo do mútuo bancário for firmado por tempo determinado, chegando este ao seu final, cabe ao mutuário, impositivamente, liquidar a obrigação anteriormente assumida. Na maioria das vezes, o contrato fixa a data do vencimento e os valores devidos. Caso o devedor não cumpra a obrigação, incorrerá em mora, sujeitando-se, ipso facto, às consequências de seu acto. O devedor, anote-se, poderá liquidar suas obrigações antecipadamente, conforme dispõe o art. 1147° do Código Civil. Na falta de estipulação de prazo, a obrigação do mutuário, tratando – se de mútuo gratuito, só se vence trita dias após a exigência do seu cumprimento, se o mútuo for oneroso e não se tiver fixado prazo, qualquer das partes pode pôr termos ao contrato, desde que o denuncie com uma antecipação mínima de trinta dias, (n.º 1 e 2 do artigo 1148° do CC).

Contrato de abertura de crédito

A abertura de crédito é um contrato mediante o qual o banco promete, por determinado período de tempo ou por tempo indeterminado, ter à disposição do cliente uma certa quantia em dinheiro ou prestar-lhe uma garantia, ficando o segundo obrigado a pagar as comissões que forem devidas e, na medida da disposição efectiva do crédito a reembolsar ao banco e a satisfazer os respectivos. Em outras palavras: a obrigação do banco nesse tipo de contrato é colocar a hora e a tempo à disposição do creditado a soma convencionada. Enquanto o creditado não manifesta a vontade de utilizá-la nada deve ao banco.
É contrato consensual, é oneroso bilateralmente , porque importa em obrigações de ambas as partes ( o cliente force garantias, por exemplo), é não solene , porque não requer forma especial, e se caracteriza , principalmente, por ser de execução continuada. Diferentemente de mútuo, por exemplo, não requer a efectiva entrega do dinheiro (portanto não é contrato real, é consensual) já que se aperfeiçoa com assinatura das partes ( basta o consenso das partes).
As operações revestem -se de menos interesse para os bancos pois terão dinheiro tendencialmente imobilizado e não produtivo. Mas , para cliente há grandes vantagens:
 Correspondência entre o momento da utilização do crédito e da necessidade de fundo;
 Adaptação do montante de crédito utilizado à necessidade efectiva;
 Cálculo dos juros limitados ao tempo e ao montante da utilização efectiva.
As principais teorias sobre a natureza jurídica dos contratos de abertura de credito são as seguintes:
a) A abertura de conta como contrato de empréstimo
O C.C, artigo 1142°, define o mútuo ou empréstimo como sendo ''o contrato pelo qual uma das partes empresta à outra dinheiro ou outra coisa fungível , ficando a segunda obrigada a restituir outro do mesmo género e qualidade.


Desta definição se pode concluir que o empréstimo implica sempre a ''traditio rei'' (entrega) da coisa mutuada. Ora ,o contrato de abertura de credito fica perfeito no momento da sua celebração , não dependendo da efectiva utilização do crédito concedido por parte do cliente, o que até se pode não verificar.
b) A abertura de credito como promessa de empréstimo
Alguns autores , dentre os quais o Prof. Pinto Coelho ''operações de Banco '' defendem a teoria segundo a qual a abertura de credito é uma promessa unilateral de empréstimo em que só o estabelecimento creditante se vincula , conservando o creditado a liberdade de celebrar ou não contrato prometido –o empréstimo.
Esta concepção do contrato de abertura de crédito tem como fundamento a designada teoria do contrato preliminar, de acordo com o qual aquele mais não seria do que uma convenção mediante a qual se prepara a celebração de subsequentes contratos ou actos definitivos e principais.
c) A abertura de crédito como contrato bancário sui generis
Segundo esta teoria a operação bancária de abertura de crédito teria dois momentos. Numa primeira fase , correspondente ao momento da celebração do contrato ,o banco vincula-se a determinada prestação , quando tal for solicitado pelo cliente .este , por sua vez , assume a obrigação de pagar a comissão de abertura de crédito .

Numa segunda fase , pode eventualmente não ocorrer , o banco ,mediante manifestação de vontade do cliente efectua a prestação prometida.
O contrato bancário de abertura de crédito é um contrato ''sui generis'' , é um contrato nominado mas atípico e corresponde a um tipo social sedimentado nos usos e em claúsulas contatuaus gerasi. O contrato bancário de abertura de crédito é consensual e definitivo , sinalagmático.
Contrato de antecipação bancaria
A antecipação bancária pode ser definida como o contrato pelo qual o Banco adianta certa importância pecuniária ao cliente contra a entrega de uma garantia real do pagamento do empréstimo , a qual será executada caso haja inadimplento da obrigação.
É uma operação de crédito pela qual a instituição ou banco entrega ao cliente uma determinada quantia a título de adiantamento sobre determinada actividade e mediante a constituição de uma garantia real em títulos de créditos , ou em mercadorias ou documentos representativos destas ,dados em penhor mercantil e cujo valor tem relação com a soma adiantada (MOLLE, 1973).

A antecipação bancária se caracteriza:

1. Pela oferta de uma garantia dada pelo interessado;
2. Pelo adiantamento pecuniário de um crédito cambiário lastreado pela garantia e;
3. Por ser concedido por banco ou instituição financeira equiparada.
As formas de antecipação bancária variam em função dos objectos sobre os quais recairá a garantia real, podendo incidir:
 -Sobre mercadorias ou documentos representativos destas;
-Sobre títulos de crédito representativos de mercadorias;
-Sobre outros títulos em geral e sobre direitos creditórios diversos.
Tal contrato é real , bilateral e oneroso.


É real porque se aperfeiçoa com a tradição do dinheiro adiantado pelo banco ao cliente contra garantia pignoratícia. É bilateral porque gera obrigações a ambas as partes. O banco fica obrigado pela guarda e conservação da garantia dada e à sua devolução havido o pagamento. É oneroso porque traz vantagens para ambas as partes.

O banco percebe os juros remuneratórios e o cliente obtém o dinheiro que necessita sem precisar alienar o seu património. A obrigação do banco nesse tipo de contrato consiste em entrega ao cliente a quantia geralmente correspondente a 70% ou 80 % do valor dos bens dados em garantia e sobre os quais o Banco manterá guarda e conservação. Não podendo o banco de dependências para guarda e conservação das mercadorias ele pode confiar a custodia ao armazém geral às expensas do cliente ou mesmo nomeá-la depositário mediante termo de responsabilidade civil e criminal , podendo ainda exigir um seguro do bem custodiado.

Extinção do contrato de antecipação bancária
Extingue – se o contrato não apenas pelo adimplemento da obrigação, mas também se houver perecimento ou diminuição da coisa dada em garantia sem reposição pelo devedor em tempo oportuno, ou vence antecipadamente o contrato em caso de falência do devedor ……..
Formas de garantia
Mercadoria – o solicitante do adiantamento oferece mercadoria para assegurar o cumprimento do contrato ao banco, cabe a guarda e a conservação.
Títulos de crédito em geral – transmissão parcial do título de crédito mediante endosso caução.
Títulos representativos das mercadorias – constituem os que são emitidos pelos transportares ou depositários públicos em relação às mercadorias entregues para transporte ou guarda.
Crédito do cliente : a garantia é formada por créditos líquidos e certos do cliente. Ex: antecipação do imposto de renda.

Noção de garantia bancária autónoma e distinção em relação à fiança.
A garantia bancária autónoma1 é uma garantia pessoal, prestada por uma instituição de crédito (geralmente um banco) que tem como propósito indemnizar alguém em determinado montante pela verificação de determinado evento a que as partes tenham atribuído relevância num contrato celebrado entre elas (normalmente designado de contrato base). Esse evento é, em princípio, o alegado incumprimento do contrato base. Como indica o nome, esta garantia caracteriza-se pela sua autonomia, distinguindo-se, por isso, claramente da fiança, cuja característica essencial é a acessoriedade.

A distinção entre a fiança e a garantia bancária autónoma passa necessariamente por distinguir as suas características essenciais: a acessoriedade e a autonomia. Enquanto a acessoriedade da fiança se traduz no facto de a obrigação do fiador se moldar necessariamente à do afiançado arts. 627.º/1 e /2 e 634.º CC, a autonomia significa que o garante assegura a verificação de um determinado resultado, totalmente independente da obrigação assumida pelo devedor no contrato base2. Em termos práticos, na fiança, o fiador pode invocar a invalidade da fiança por causa da invalidade da obrigação principal (632.º/1 CC), bem como invocar contra o credor quaisquer meios de defesa que competem ao devedor (637.º/1 CC). Na garantia bancária autónoma, o garante não pode invocar, em princípio3, quaisquer meios de defesa provenientes de relações jurídicas distintas da assumida por este com o beneficiário. Por outras palavras, a autonomia destas garantias traduz-se na inoposição de excepções por parte do garante ao beneficiário, salvo os meios de defesa que forem próprios do garante na relação que tenha com o beneficiário.

Processo conducente à relação jurídica no âmbito da qual se encontra a garantia bancária autónoma propriamente dita, ou processo genético de emissão de uma garantia bancaria autónoma.
Feita a introdução à figura autónoma, e tendo sempre presente as suas características, constatamos que esta é a mais enérgica das garantias e serve não só os fins do comércio internacional, mas também os do comércio interno. É de uso corrente entre nós, nomeadamente na área dos concursos de obras públicas e dos contratos de empreitada, sendo eleita pelos agentes dos negócios como a mais segura, expedita e eficaz das garantias. A figura da garantia bancária autónoma exige no mínimo três intervenientes, a saber: um ordenante, que também será devedor (na relação subjacente) e garantido; um banco que será o garante e um beneficiário que será também credor. Teremos, então, três intervenientes, que assumirão estas diferentes designações de acordo com a relação que estaremos a tratar, que vão dar lugar a três relações jurídicas entre si. Podemos, desta forma, constatar que o processo de formação de uma garantia bancária autónoma assenta num triângulo cujas três faces são três relações jurídicas distintas, normalmente contratuais.

Consideremos o seguinte exemplo: A (devedor) e B (credor) celebram um contrato entre si, um contrato de compra e venda internacional. Este contrato constitui a relação jurídica principal ou subjacente que se pretende garantir e como tal vai ser a base do nosso triângulo16. B, importador, teme o risco de incumprimento total ou parcial da obrigação, ou o cumprimento tardio ou defeituoso por parte do exportador A, pois tal frustraria por completo a utilidade da mercadoria. Uma forma de superar este risco consiste precisamente na utilização da figura da garantia bancária autónoma. Para o efeito, A obriga-se a conseguir um garante (normalmente um banco) que assegurará que o B, beneficiário, receberá uma quantia pecuniária previamente fixada mediante a alegação do incumprimento da outra parte ou ainda de preferência imediatamente, logo que o banco seja interpelado para tal pelo B, mediante declaração. Esta obrigação do A, na maior parte dos casos consta numa das cláusulas do contrato base e em certos casos este contrato só é celebrado mediante a certeza de existência de garantia bancária.

al um banco, de estabelecer uma relação jurídica com o B na qual prestará a referida garantia ao beneficiário mediante o cumprimento de uma série de requisitos que constarão do próprio texto da garantia. Aqui serão convencionadas as condições em que o banco garante assume a referida garantia, as contrapartidas e demais obrigações. Esta relação que se estabelece entre o devedor da relação principal e o banco garante tem sido qualificada, entre nós, quer na doutrina, quer na jurisprudência, como sendo um contrato de mandato: mandato sem representação nos termos do art. 1157.º e 1180.º do CC, pelo qual o banco garante se obriga perante o devedor da relação principal, também designado ordenante, em contrapartida de certa retribuição, a estabelecer com o correlativo credor uma relação no âmbito da qual prestará uma garantia bancária autónoma, mediante certas condições. O banco vai actuar em nome próprio, pois será ele quem responderá pela obrigação de prestar garantia, sendo esta uma obrigação própria. O banco actua em nome próprio, mas por conta do dador da ordem (devedor garantido).


É nesta última relação entre o garante e o beneficiário que se encontra a garantia propriamente dita. Nesta relação o banco garante obriga-se a entregar uma soma pecuniária determinada ao beneficiário, logo que este alegue o incumprimento da relação jurídica subjacente e junte os documentos necessários para o efeito, ou de imediato quando este simplesmente o interpele a realizar essa prestação, mediante declaração. Nisto consiste a garantia bancária autónoma. Esta relação vem sendo qualificada entre nós, tanto pela doutrina como pela jurisprudência, como sendo uma relação contratual com carácter não sinalagmático, da qual decorre para o garante a obrigação de prestar a garantia e para o beneficiário o correlativo direito de crédito. Não nós vamos ocupar, por agora, da qualificação do regime, pois fá-lo-emos mais à frente.


Causalidade e Abstracção.

Através da garantia bancária autónoma o garante não se obriga a produzir o resultado a que está obrigado o devedor (ordenante), ao invés responsabiliza-se pelo risco da sua não produção. O garante obriga-se, mediante certas condições, a entregar determinada quantia pecuniária, não se obriga em nenhum caso a cumprir a obrigação que o devedor deixou de satisfazer.
Considerar a garantia bancária autónoma como abstracta seria obstar à sua admissibilidade entre nós por força do princípio da causalidade. Mas se há autores que integram a garantia bancária autónoma entre os negócios jurídicos causais e duvidam da sua validade no nosso ordenamento jurídico, outros há que a apesar de a considerarem um negócio abstracto concluem pela sua validade. Cumpre então tomar posição deixando claros os conceitos em causa. Sabendo que autonomia e abstracção não se confundem, na figura da garantia bancária autónoma a autonomia consiste na inoponibilidade de excepções por parte do garante ao beneficiário que derivem tanto da relação do garante com o garantido como da relação base (entre garantido e beneficiário). Abstracção, por outro lado, consiste na omissão da causa da garantia. Nada obsta a que tenhamos actos causais dotados de autonomia, pois bem, tal ocorre precisamente na garantia bancária autónoma.
Qualificação da relação jurídica entre o garante e o beneficiário a garantia bancária autónoma como negocio jurídico unilateral .


Como vimos, a posição maioritária, quer na doutrina, quer na jurisprudência é a de que a relação que se estabelece entre o banco (garante) e o beneficiário é uma relação contratual. Mas na verdade, só perante uma análise casuística é que se poderá aferir. Na prática, a declaração do banco (garante) é no sentido de pôr à disposição do beneficiário tal montante pecuniário, quando este prove o incumprimento da obrigação a que o devedor estava adstrito no contrato base, ou quando este a solicite, nos termos previstos na garantia, mediante a apresentação de uma declaração. Isto é, não se espera uma aceitação por parte do beneficiário e na maior parte dos casos esta aceitação não ocorre, quer expressa ou tacitamente, o que nos levaria a dizer que certos casos parecem consubstanciar um negócio jurídico unilateral e não já um contrato, pois há apenas uma única declaração negocial da qual resultam todos os efeitos jurídicos estipulados. Esta simples declaração negocial parece vincular o seu autor (banco/garante), em termos da constituição da obrigação de prestação da garantia autónoma. Ocorre que entre nós se encontra consagrado, no art. 457.º do CC, o princípio da tipicidade dos negócios jurídicos unilaterais enquanto fonte de obrigações, e de acordo com FRANCISCO CORTEZ se defendêssemos a tese de que a relação entre garante e beneficiário se consubstancia num negócio jurídico unilateral posição isolada na doutrina teríamos que rejeitar liminarmente a admissibilidade da figura no direito português face ao princípio da tipicidade nos negócios jurídicos unilaterais (art. 457.º CC) 36. O professor CARLOS FERREIRA DE ALMEIDA defende que em certos casos podemos estar perante um negócio jurídico unilateral, legitimando esta posição por força do costume internacional. O costume é uma das fontes primárias do direito internacional e consiste na prática reiterada dos sujeitos do Direito Internacional, isto é, numa prática geral aceite como sendo direito. Pois a prática é a da emissão da declaração por parte do garante (banco) dando conta da existência de uma garantia constituída a favor do beneficiário e não se espera a aceitação deste, nem a declaração do banco está formulada nesse sentido. Parece que esta declaração do banco o vincula em termos de constituição da obrigação de prestação de garantia, não estando sujeita
Relação entre o dador de ordem e o garante é qualificável de contrato a favor de terceiro.
Se respondemos que sim, o problema que se levanta é que o direito do terceiro (beneficiário) está dependente das vicissitudes da relação entre promitente e promissório (garante e dador de ordem) art. 449.º CC. Isto é, o promitente (banco) poderá opor os meios de defesa derivados do contrato celebrado com o promissário. Daí que se argumente que, se considerarmos que tal relação entre o dador de ordem e o garante é qualificável como contrato a favor de terceiro, a característica essencial da autonomia se perderia. Questão que se coloca é se a norma do art. 449.º CC será supletiva ou imperativa? Se for imperativa, não é afastável e, por isso, prejudica-se a autonomia da garantia; mas, por outro lado, se for supletiva, o promitente e o promissário poderão afastá-la e, nesse caso, a autonomia da garantia não fica prejudicada. Em qualquer caso, a qualificação de contrato a favor de terceiro tem a consequência de alterar a figura triangular de relações já enunciada, uma vez que a garantia seria um mero efeito decorrente desse contrato, nos termos do art. 444.º/1 CC. Isto significa que a garantia bancária autónoma nasceria directamente do contrato a favor de terceiro, não se podendo qualificar nem de contrato nem de negócio jurídico unilateral a garantia não seria um negócio jurídico. Na verdade, a tendência jurisprudencial, tendo em conta as decisões por nós analisadas, não vai no sentido de qualificar tal relação entre o devedor e o banco de contrato a favor de terceiro, não se chegando sequer a indagar sobre a sua configuração.


Cartas De Conforto
Noção
As cartas de conforto, segundo o Dr. Vasco Soares da Veiga, são simples compromissos de honra assumidos por uma determinada sociedade, subscritora da carta, perante um Banco, em que apresenta um certo cliente, beneficiário do crédito, em regra, uma sociedade sua afiliada ou em que detém acções ou quotas significativas ou mesmo dominantes, visando a concessão de crédito bancário.
Generalidades
Da noção acima, fácil será de perceber que as cartas de conforto são meras obrigações morais, assumidas por entidades de reconhecida solvabilidade, sem contudo constituir garantias pessoais formais, tais como, a fiança, o aval, entre outras, que lhes acarretariam uma responsabilidade solidária com a sociedade credora.
O incumprimento do crédito bancário pela sociedade filha, para a qual o compromisso foi assumido, geralmente, faz à subscritora perder a credibilidade, prestígio e reputação que gozava junto da Banca.
Todavia, nem sempre é assim, pois, embora aceites pelo Banco, destinatário das mesmas, sem nenhum conteúdo obrigacional para o seu emitente, essas cartas podem “implicar diversos graus de esforço que vão desde verdadeiras garantias em sentido próprio até simples teores informativos, passando por empenhos mais ou menos vincados”.
Mas para caracterizar a natureza das obrigações que delas resultam é necessário analisar os termos dessas cartas e daí concluir se são obrigações só morais, jurídicas ou se essas duas situações se entrelaçam.
E, dada a diversidade dos teores nelas constantes, já se vê que não é possível construir um conceito unitário sobre a natureza dessas cartas.

Modalidades De Cartas De Conforto

As cartas de conforto, conforme se disse acima, não fazem emergir apenas obrigações morais, cuja consequência é a perda de credibilidade, mas também jurídicas, dependendo do tipo que tiverem assumido.
Segundo a doutrina, distinguem-se três tipos de cartas, designadamente, as cartas de conforto fraco, médio e forte:

Cartas De Conforto Fraco
São aquelas em que há apenas simples declarações, constitutivas de um compromisso moral, ou de uma obrigação natural, consubstanciado por um dever genérico de diligência.

Nelas, a sociedade subscritora apresenta-se na relação com um mínimo de estabilidade, dando apenas indicação ao Banco sobre a política do grupo (vg. É nosso hábito manter as sociedades nossas participadas em condições financeiras de honrar os seus compromissos), o conhecimento da situação financeira e o nível de confiança a depositar na sociedade afiliada.
Havendo incumprimento da obrigação pela sociedade filha, a subscritora, negando qualquer valor à carta que subscreveu, difícil será responsabilizá-la.
Porém, poderá, pela sua actuação, a subscritora incorrer em responsabilidade civil delitual, prevista nos arts. 483.º e 485.º do Código Civil (doravante CC), se se constatar que, a mesma por falta de diligência, por imprudência ou negligência na declaração feita, induziu o banqueiro a crer na solvabilidade da beneficiária, e com isso a conceder o crédito, vindo a causar prejuízos ao Banco.

Carta De Conforto Médio

Nestas cartas, para além de conceder informação, recai sobre a subscritora uma obrigação jurídica de meios, isto é, de facere ou de non facere, em que a subscritora se obriga a fazer algo que permita que a sociedade devedora cumpra com a obrigação que contraiu.
Na sequência, a subscritora compromete-se a envidar esforços com vista a “acautelar os interesses dos bancos, proporcionando o efectivo cumprimento dos compromissos assumidos” no acto da celebração do contrato.


Carta De Conforto Forte
Nesta modalidade de cartas, além da obrigação de prestar informações, a subscritora assume a obrigação de resultado, ou seja, de colocar ou manter a devedora em condições de cumprir com a obrigação contraída junto do Banco.

Tal obrigação de resultado, ou, simplesmente, dever específico traduz-se na ideia de que a subscritora garantirá o cumprimento regular das obrigações pelo devedor e que em caso de incumprimento do crédito será debitado o montante na sua conta bancária, ou que disponibilizará fundos necessários à amortização do crédito.
Nestes casos, as sociedades dominantes respondem pelas obrigações das sociedades dominadas ou até prometem assumir as responsabilidades da participada se ocorrerem alterações significativas da estrutura do capital social da devedora, donde passa tal obrigação a assumir a natureza de promessa de garantia, in casu, promessa de fiança.
Diferentemente do tipo de cartas acima descritas, a inexecução do contrato, presume-se incumprimento contratual para a subscritora, podendo resultar na propositura de acção por perdas e danos, contra a subscritora, nos termos do art. 798.º, 799.º e 562.º, todos do C.C.
A referida responsabilidade que impenderá sobre a subscritora não resultará da figura da fiança (art. 628.º do CC), que não se presume, mas do facto de não ter prestado apoio à beneficiária do crédito a fim de cumprir com a obrigação, nos termos dispostos na carta, prejudicando assim o Banco.
Regime Jurídico Das Cartas De Conforto
Os termos em que se apresentam as cartas de conforto, determinando-as se de teor fraco, médio ou forte, caracterizarão o regime a elas aplicável.

Autonomia Da Vontade
Nas cartas de conforto, encontramos o predomínio do princípio da autonomia privada, limitado, em termos gerais pelas disposições dos arts. 280.º e ss. do C.C., visto que a subscritora pode apor, nelas, os termos ou condições, ou mesmo limitar quantitativamente o montante confortado, na proporção detida pela subscritora.

Dolo Ou Negligência Nas Informações Prestadas

A declaração contida nas cartas de conforto, na óptica do Dr. Vasco Soares da Veiga, pode considerar-se um negócio jurídico unilateral receptício, uma vez que a declaração é dirigida e comunicada a certo destinatário.
Neste contexto, as informações nelas contidas devem ser fidedignas, nos termos do art. 485.º do C.C., sob pena de gerar responsabilidade civil.

Responsabilidade Pré-Contratual
No caso de as cartas antecederem a concessão do crédito, importa salientar que apesar do disposto sobre a responsabilidade pré-contratual (art. 227.º do CC) aplicar-se apenas a contratos, o Dr. Vasco Soares citando a Dra. Ana Prata, entende que tanto os negócios jurídicos unilaterais como os puros actos jurídicos, desde que tenham um destinatário também lhes é aplicável aquele regime.
E, na sequência, prosseguindo com a Dra. Ana Prata, a mesma refere que “o dever de lealdade pré-contratual impõe que a parte que saiba ou deva saber com normal diligência que algum risco ameaça o sucesso do processo negociatóroio, deve comunicar à contra-parte, advertindo da necessidade de adequada prudência na realização de gastos, ou na privação de ganhos.”
Ora, a violação de um tal dever constituirá, obviamente, uma conduta omissiva, ou mesmo positiva, que a nosso ver, a par do dolo, também a negligência é susceptível de responsabilidade civil, dependendo de caso a caso e da natureza das relações estabelecidas entre o Banco e a subscritora.

Responsabilidade Delitual
Se a subscritora da carta tiver tido conhecimento da difícil situação económica atravessada pela beneficiária e, ainda assim, fingir ignorá-la para conseguir a concessão do crédito a favor daquela, a sua conduta gerará a responsabilidade delitual, prevista no art. 483.º do C.C.
E, por esta razão haverá sempre o dever de indemnizar pelos danos causados ao Banco, nos termos do n.º 2 do art. 485.º do C.C.
Havendo mera culpa, impõe o art. 494.º do C.C. limitação equitativa da responsabilidade, diferentemente nos casos em que há dolo (art. 483.º do C.C.), donde decorre que a indemnização corresponderá aos danos, nos termos previstos no art. 562.º do C.C.

Responsabilidade Por Abuso De Direito
Decorrente do dever de informação, há-de ver-se se a subscritora excedeu os limites impostos pela boa fé, nos termos do n.º 2 do art. 762.º do CC, ou se abusou do direito de informar ao prestar a declaração que foi determinante da concessão do crédito, nos termos do art. 334.º do CC, pala boa fé ou pelos bons costumes.
A responsabilidade, aqui, nasce do facto de, 'se é cognoscível que uma informação é pedida para servir como base ou elemento para uma decisão patrimonial, há-de haver um mínimo de cuidado exigível no tráfico'.
E na mesma perspectiva, a indução do Banco a contratar por via da subscrição de uma carta de conforto, seguida de um comportamento contrário ao do conteúdo da declaração, poderá constituir um “venire contra factum proprium”, ou seja, a subscritora age com o fim de criar no Banco a convicção legítima de que terá um certo comportamento, positivo ou negativo, para de seguida vir a proceder contrariariamente a essa expectativa.


 Bibliografia
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  • DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 23. Ed., São Paulo, Saraiva, 2007, p.689
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  • DALLAGNOL, Deltan Martinazzo. Contratos bancários: conceito, classificação e características. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 59, 1 out. 2002. Disponível em: e em < http://www.ambito-jurídico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=4608&g...; Acesso em: 20 Abril. 2018.
  •  Vista em: https://escola.mmo.co.mz/introducao-ao-direito-bancario/#ixzz5IdZcc7qD
  • http://direitomozeam.blogspot.com/p/o-contrato-de-mutuo-tem-origem-no.html 

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