Acto administrativo é o acto jurídico unilateral praticado, no exercício do poder administrativo, por um órgão da administração ou por outra entidade pública ou privada para tal habilitada por lei, e que traduz uma decisão tendente a produzir efeitos jurídicos sobre uma situação individual e concreta».
A Definitividade e a Executoriedade Do Acto Administrativo Como Pressupostos Legais do Recurso Contencioso
Nos termos do nº 1 do artigo 33 da LPAC, só é admissível recurso contencioso dos actos administra- tivos definitivos e executórios. Neste sentido, a LPAC manteve os mesmos requisitos de admissibilidade de recursos contenciosos na jurisdição administrativa que eram consagrados no nº 1 do artigo 27 da LPAC 2001, por ela revogada. Durante a preparação da publicação desta obra, ficou-se a saber que o Conselho Constitucional declarou inconstitucional o nº 1 do artigo 33 da lei nº 7/2014, de 28 de Fevereiro, através do acórdão nº 6/CC/2016, de 23 de Novembro, com base nos mesmos fundamentos aduzidos no acórdão nº 8/CC/2015, de 24 de Setembro, com os quais não concordamos, conforme fundamentaremos mais adiante.
Segundo Gilles CISTAC Apud Estrelino Duvane pág. 78, que fez parte da equipa produtora, no anteprojecto da LPAC de 2001 a recorribilidade dos actos administrativos tinha como pressuposto a lesão de direitos ou interesses legal- mente protegidos dos administrados, mas o Conselho de Ministros, na versão final da proposta desta lei, submetida à Assembleia da República, substituiu aquele pressuposto pelo critério clássico da definitividade e executoriedade. «Esta escolha que será consagrada pelo parlamento não favorece ou não facilita verdadeiramente o acesso, pelos particulares, à justiça administrativa e constitui, de facto, uma barreira que a Administração Pública aproveita de forma passiva vista a complexidade do conceito da palavra definitividade». A não verificação destes requisitos tem como consequência jurídica a rejeição liminar do pedido, por força do disposto na alínea d), do nº 2, do artigo 58 da LPAC, por despacho do relator, à luz da alínea i) do nº 2, do artigo 20 desta Lei.
Os actos administrativos definitivos e executórios integram-se numa vasta classificação de actos administrativos que Diogo Freitas do AMARAL a organiza da seguinte maneira:
ü Quanto ao autor do acto administrativo – em decisões ou deliberações conforme o autor seja singular ou colegial;
ü Quanto à composição do órgão autor do acto – em actos simples e complexos quando praticados por um único órgão ou por mais de um órgão, respectivamente;
ü Quanto aos destinatários do acto administrativo – em actos singulares, colectivos, plurais e gerais;
ü Quanto aos efeitos do acto no tempo – em actos de execução instantânea ou continuada;
ü Quanto à localização do acto no procedimento e hierarquia administrativas – em actos administrativos definitivos e não definitivos, e,
ü Quanto à susceptibilidade de execução administrativa do acto – em actos executórios e não executórios.
O Acto Administrativo Definitivo. Espécies De Definitividade
Sob Diogo Freitas do AMARAL apud Estrelino Duvane pág. 79, actos definitivos são os actos administrativos que tem por conteúdo uma decisão horizontal ou verticalmente final». Donde resulta que a definitividade do acto administrativo pode ser horizontal ou vertical.
No plano horizontal, o acto administrativo é a «conclusão de todo um processo que se vai desenrolando no tempo – o procedimento administrativo». É que o acto é sempre precedido por uma série de formalidades, de actos preparatórios, de estudos, de pareceres ou de projectos, que vão ajudando a formar e a esclarecer a vontade da administração. Neste caso, da definitividade horizontal, importa considerar a localização do acto no procedimento, podendo ser praticado por qualquer órgão subalterno, desde que ponha termo ao procedimento administrativo.
O plano vertical do acto administrativo toma em consideração a localização, dentro da hierarquia administrativa, do órgão da Administração que o pratica, podendo ser um órgão subalterno, um órgão superior de uma hierarquia, ou um órgão independente não inserido em nenhuma hierarquia. Neste sentido, vertical, «só são definitivos os actos praticados por aqueles que em cada momento ocupam o topo de uma hierarquia, ou sejam independentes». Aqui, a definitividade do acto afere-se em função da posição que, na hierarquia administrativa, é ocupada pelo órgão que o pratica, devendo sempre ser praticado pelo órgão que ocupa a posição suprema na hierarquia (por exemplo, Governo e seus membros, titulares de órgãos das autarquias locais, dos institutos públicos, das associações públicas, órgãos independentes, órgãos subalternos com competência reservada ou com competência exclusiva). Será esta a solução abraçada pelo ordenamento jurídico moçambicano?
O nosso legislador não esclarece se a definitividade do acto administrativo para efeitos de impugnação contenciosa deve ser vertical ou horizontal, nem se refere ao tipo de órgão que, dentro da hierarquia administrativa, o deve praticar, para que seja tido como definitivo. Julgamos por isso que, para este efeito, basta que a decisão tenha sido tomada por qualquer entidade, desde que esta seja legalmente classificada como órgão de uma pessoa colectiva de direito público, para que seja contenciosamente recorrível.
De acordo com o glossário do anexo da LPA, e com a alínea a), do artigo 1 das NFSAP, designa-se por acto administrativo definitivo e executório a «decisão com força obrigatória e dotada de exequibilidade sobre um determinado assunto, tomada por um órgão de uma pessoa colectiva de direito público». Ou seja, a executoriedade do acto administrativo tem a ver com a sua exequibilidade, enquanto a definitividade do mesmo está relacionada com a força obrigatória do acto, sendo que, num e noutro caso, o mesmo deve ser praticado por um órgão de uma pessoa colectiva de direito público. No mesmo sentido vai a definição legal do acto administrativo: «decisão de um órgão da administração que, nos termos de direito público, visa produzir efeitos numa situação individual e concreta». Nestas definições, a palavra órgão é fulcral.
Mas, o que são órgãos de pessoas colectivas públicas, ou órgãos públicos? «Órgãos públicos são centros de decisão que formulam uma vontade que é referida à respectiva pessoa colectiva pública». «A vontade funcional que se gera no âmbito do órgão público é depois atribuída – imputada – à pessoa colectiva, deixando de pertencer às pessoas que a protagonizam». Cabe à lei que cria, organiza, e estabelece o modo de funcionamento das pessoas colectivas públicas ou das suas extensões ou representações, estabelecer, expressamente, quais são os órgãos dessas pessoas ou representações, e, são esses órgãos que, julgamos, serão tidos em conta, para efeitos de classificação das suas decisões não só como actos administrativos, mas sobretudo como definitivos e executórios, conforme definido pela LPA.
Os órgãos de pessoas colectivas públicas podem ser, nomeadamente, superiores ou inferiores, quanto à sua hierarquia; e centrais ou locais, quanto à sua localização e função.
Nos termos das disposições conjugadas dos artigos 7 da CRM, e 1 da Lei nº 8/2003, de 19 de Maio, a República de Moçambique organiza-se territorialmente, do maior ao menor, em Províncias, Distritos, Postos Administrativos, Localidades e Povoações, cujos órgãos106, no contexto da administração pública são, respectivamente, o Governador e o Governo Provinciais, o Administrador e o Governo Distritais, o Chefe do Posto Administrativo e o Chefe da Localidade, nos termos dos artigos 15, 33, 45 e 48 da LOLE, sendo que, os escalões menores se subordinam e respondem sucessiva e cumulativamente108 aos superiores.
Ao nível do Distrito, o respectivo Governo109 é composto pelo Administrador Distrital, pelo Secretário Permanente Distrital e pelos Directores dos Serviços Distritais, cada um dos quais com as suas respectivas competências. Por exemplo, em matéria económica, compete ao Administrador Distrital autorizar o exercício das actividades comerciais, nos termos da Lei, enquanto no âmbito da planificação e orçamentação, cabe ao Secretário Permanente Distrital autorizar as despesas do orçamento, dentro dos limites e parâmetros fixados.
Assim, por exemplo, a recusa não fundamentada de licenciamento para o exercício de uma determinada actividade comercial pelo Administrador Distrital pode ser contenciosamente recorrida ao tribunal administrativo, por se tratar de um acto administrativo definitivo e executório, visto ter sido praticado por um órgão, o Administrador, que faz parte de uma pessoa colectiva de direito público, o Estado-administração. Mas o mesmo recurso contencioso já não seria legalmente aceite caso se fundasse na ilegalidade da recusa do Secretário Permanente Distrital em autorizar a realização de uma despesa que coubesse nos limites e parâmetros legalmente abrangidos pelas suas competências, pois, este não é um órgão da administração pública, e, por conseguinte, a sua decisão não só não é definitiva, como nem acto administrativo é. Estamos perante uma situação em que a lei atribui competências a uma pessoa colectiva de direito público, para tomar decisões sobre determinadas matérias, sem que seja órgão. Assim, para lançar mão ao recurso contencioso, o interessado lesado pela decisão do Secretário Permanente teria de provocar a intervenção do superior hierárquico deste, o Administrador Distrital, para conferir a definitividade orgânica ao acto administrativo de recusa (se este também recusar).
No exemplo dado, os actos administrativos do Administrador Distrital, tanto no primeiro caso (da recusa do licenciamento da actividade comercial), como no segundo (da hipotética recusa da autorização da despesa), são organicamente definitivos e recorríveis, nos termos acima explicados, enquanto a decisão de recusa de autorização da despesa pelo Secretário Permanente Distrital, que tinha quase tudo para ser considerada horizontalmente definitiva, por consubstanciar a «conclusão de todo um processo que se vai desenrolando no tempo – o procedimento administrativo», não é contenciosamente recorrível, por ter sido praticado por quem, embora pertença a uma pessoa colectiva de direito público, não é legalmente qualificada como órgão.
Daqui decorre que, a despeito da ausência de disposição expressa da lei, por via da interpretação se chega à conclusão de que a definitividade dos actos administrativos, para efeitos de recurso contencioso, no nosso ordenamento jurídico, deve ser o que chamaremos de orgânica, e não horizontal nem vertical, pois, tanto a horizontalidade como a verticalidade não conferem, por si sós, definitividade aos actos, se os praticantes destes carecerem da qualidade de órgãos. Isto é, entre nós, a definitividade do acto administrativo não depende do facto de este ter sido praticado pelo órgão mais ou menos alto da hierarquia existente dentro da pessoa colectiva, nem do facto de o acto extinguir um determinado procedimento administrativo, mas tão-somente do facto de quem o tiver praticado ser um órgão dessa pessoa colectiva.
Assim, desde que seja um órgão114 de pessoa colectiva de direito público a praticar o acto, seja local, seja central, seja superior, seja inferior, os seus actos podem ser impugnados na jurisdição administrativa, sem necessidade de passar pelo crivo das garantias graciosas. Porém, se o particular assim o entender, pode usar primeiro a via graciosa das garantias, antes de lançar mão ao recurso contencioso, visto que, nos termos do nº 2 do artigo 153 do RELOLE, o recurso hierárquico não é sempre necessário, pode também ser facultativo, consoante a decisão administrativa a impugnar seja ou não insusceptível de recurso contencioso, respectivamente. Ou seja, se a decisão for definitiva e executória, o particular pode, querendo, recorrer hierarquicamente, mas sem efeito suspensivo, nos termos do nº 11 do artigo 153 do RELOLE. Mas se a não for, o recurso será sempre necessário, suspendendo-se a eficácia da decisão recorrida, nos termos do nº 9 do mesmo artigo, a não ser que a lei disponha em contrário ou que o autor da decisão considere que a sua não execução imediata pode provocar grave prejuízo ao interesse público. O artigo 152, nºs 4 e 5, do RELOLE, segue igual solução para a reclamação.
Já na LPA, a regra geral quanto à reclamação é, por força do artigo 159, nº 1, a da eficácia do acto reclamado, a não ser que a lei disponha em contrário, ou quando o autor do acto, oficiosamente ou a pedido do interessado, considere que a execução do acto causaria prejuízos irreparáveis ou de difícil reparação para o seu destinatário; enquanto isso, o recurso hierárquico tem sempre efeito suspensivo, nos termos do artigo 166, nº 2, deste diploma legal. Logo, ao abrigo da LPA, é sempre preferível que o particular abdique da reclamação, que até é facultativa, sempre que não estejam preenchidos os requisitos de admissibilidade do recurso contencioso, indo directo ao recurso hierárquico, de forma a garantir a ineficácia do acto recorrido na pendência do recurso, e assim garantir a protecção do seu direito ou interesse.
Mas ainda que em alguns casos se mostre forçoso recorrer graciosamente para se obter a definitividade do acto, não vemos problema nisso, pois, julgamos que o principal objectivo do particular não é o acesso ao tribunal administrativo, mas sim a protecção do seu direito ou interesse, facto que se concretiza, na pendência dos recursos graciosos, que até podem vir a resolver o seu problema em definitivo, dispensando, por conseguinte, a via contenciosa.
Julgamos acertadas estas soluções do legislador, pois, se por um lado protegem os direitos ou interesses dos particulares, por outro inibem que estes lancem mãos a garantias administrativas inúteis, com possibilidade de causar prejuízos para si próprios, designadamente, a preclusão do prazo para o recurso contencioso.
O acto administrativo executório
O acto administrativo executório enquadra-se na classificação dos actos administrativos com base no critério da susceptibilidade de execução administrativa.
Legalmente, os actos administrativos são executórios desde que se mostrem aptos para a produção dos seus efeitos. Já para a doutrina de Diogo Freitas do AMARAL apud Estrelino DUVANE pág. 84, são executórios os actos administrativos simultaneamente exequíveis e eficazes cuja execução por via administrativa não seja vedada por lei, sendo exequíveis os actos que impõem deveres ou encargos estruturalmente passíveis de execução coerciva contra os particulares, e eficazes os actos que produzem actualmente os efeitos característicos do seu tipo legal ou outros que a lei lhes atribui.
Forma De Citação Do Blogue
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Ao leitor
Ficar-lhe-emos assaz agradecidos se nos der a conhecer a sua opinião acerca do presente blogue.
falta as referencias bibliograficas
ResponderEliminarANOTADO E OBRIGADO
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