O conceito filosófico de trabalho é abrangente dos demais e sofre a influência da atitude em que se põe o pensador diante do problema do universo e do homem.
Na Antiguidade e na Idade Média, o espírito, entendido como mera contemplação, leva a um conceito negativo de trabalho. “O trabalho é a retribuição da dor mediante a qual os deuses nos vendem os bens”, diz Xenofonte. Para o pensamento clássico grego, o trabalho é tido como um castigo dos deuses. É algo que avilta o homem e deve ser evitado. O mesmo sentido negativo de trabalho é o de Aristóteles. Sustenta que a “escravidão de uns é necessária para que outros possam ser virtuosos”. Em outras palavras, o homem deve ser livre para se dedicar à própria perfeição. O trabalho o impede de consegui -lo. Só a vida contemplativa e não a vida activa leva o homem à dignidade. Também Platão desdenha o trabalho. Diz: “os trabalhadores da terra e os outros operários conhecem só as coisas do corpo; se, pois, sabedoria implica conhecimento de si mesmo, nenhum destes é sábio em função da sua arte”. Como se vê, a ociosidade era o valor, e o trabalho, o desvalor. Os sofistas, no entanto, tomam posição diferente. Para Pródico, “nada do que é bom e belo concederam os deuses ao homem sem esforço e sem estudo; se queres que a terra te produza frutos abundantes, deves cultivá -la”.
O Renascimento contribuiu para o desenvolvimento do conceito de trabalho, concebendo o homem como actividade. “São nossas, diz Gianozzo, as coisas humanas, porque feitas pelo homem; todas as coisas que vemos, as casas, os castelos, as cidades, os edifícios sem conta disseminados sobre a superfície da terra.” O Renascimento dá uma nova colocação ao problema do trabalho. A consciência do trabalho como um valor.
O valor trabalho passa a ser, daí por diante, o fundamento de todas as concepções. Várias foram as contribuições que se seguiram, todas no mesmo sentido da valorização do trabalho. Smith, aprofundando conceitos de Locke, concebe a riqueza como resultante do trabalho. Palmieri faz consistir a riqueza das nações na soma dos trabalhos nelas executados. Giambatista Vicco põe o trabalho como conhecimento e realização da cultura, dos produtos históricos e morais do homem. Em Hegel, o espírito, como actividade e objectivação, faz do trabalho o próprio meio de o homem encontrar -se.
Também os teólogos influíram na modificação do conceito de trabalho.
A concepção teológica de trabalho toma como ponto de partida a verdade da criação. Deus criou um mundo inacabado para que o homem o contemple e domine, o que pressupõe uma actividade colaboradora de Deus e uma acção do ser humano, feito à sua imagem e semelhança. O homem, criado como um ser dotado de matéria e espírito, tem a matéria regida pelas leis que disciplinam as demais coisas materiais no mundo. Como ser espiritual, participa, com sua inteligência, seu livre -arbítrio, sua actividade criadora, do mundo. No entanto, o homem, rebelando -se contra Deus, sofreu um castigo, e a partir desse momento o trabalho, como as demais acções humanas, traz consigo a marca da pena, da dor e do esforço, daí por que “do suor do teu rosto comerás o teu pão” e “com dor parirás o teu filho”. A queda do homem foi redimida por Cristo, filho de Deus, que libera o homem do pecado original na medida em que se unir a Deus. Assim, a partir de Cristo, o trabalho humano adquire novo sentido e valor, participando da obra de construção do mundo e significando a integração do homem na redenção.
Mediante o trabalho, o homem modela o mundo à imagem e semelhança de Deus, sustentam os teólogos.
Trabalho é, portanto, tudo o que concorre para criar o bem comum.
A concepção materialista de trabalho encontra raízes no pensamento de Feuerbach e na doutrina de Marx. Parte do fundamento do homem como simples matéria determinante do próprio ser envolvido num processo histórico de contradições dos meios sociais de produção, nas quais se realiza, concentrando a sua actualização no acto do trabalho. No processo de trabalho, os homens transformam os objectos da natureza para satisfazer suas necessidades. Os meios de trabalho mais importantes são os instrumentos de produção com os quais os homens atuam e transformam os objetos. O desenvolvimento da produção e o progresso técnico resultam do trabalho do homem. Os objectos produzidos contêm a objectivação do próprio homem que os faz. Assim, o homem, pelo trabalho, insere -se na própria coisa produzida e que é espoliada pelo capitalismo, daí a necessidade do resgate por meio da socialização da propriedade.
Como conclusão das diversas concepções acima expostas, o trabalho é, qualquer que seja a cosmovisão do intérprete, uma mediação entre o homem e a natureza. Mediante o trabalho o homem acrescenta à natureza, transformando -a das condições brutas em que se achava no início da história.
Esse processo de modificação da natureza compreende várias etapas que correspondem às grandes revoluções tecnológicas. A primeira consistiu na utilização do fogo e dos utensílios. A segunda, no cultivo das plantas. A terceira é industrial, com o aparecimento da força a vapor, a racionalização do trabalho e a automação. O homem, nesse processo, virtualiza -se, atualizando as suas potencialidades, o que supõe um mundo criativo. O homem está entre duas realidades, a ideal e a material, interligando -as pelo trabalho, que, assim, é o meio pelo qual o ser humano se incorpora à natureza. Trabalho é, em conclusão, vida. Outro aspecto importante do tema, mais precisamente das relações entre direito do trabalho e filosofia do direito, é o conceito de justiça.
A filosofia jurídica idealista ou jusnaturalismo de Giorgio del Vecchio contribuiu para a restauração do direito natural ao colocar em discussão a questão do conceito universal do jurídico na base da filosofia do direito. Inspirou -se no renascimento idealista alemão, sobretudo em suas tendências neocríticas, e logrou construir um pensamento original.
A ideia de justiça, segundo Del Vecchio, contém os seguintes elementos: a alteridade ou bilateralidade, compreendida como a simultânea consideração de vários sujeitos, postos igualmente sobre o mesmo plano, ou representados um em função do outro; a reciprocidade, entendida como a correlação incindível pela qual a afirmação de uma personalidade é ao mesmo tempo uma limitação sobre a personalidade de outra, necessariamente afirmada no mesmo ato, exigência de uma parte coordenar -se com o dever da outra, não podendo nenhum desses termos subsistir por si porque cada um vale reciprocamente como complemento do outro e deriva deste o seu próprio sentido; em outras palavras, um sujeito não pode obrar de certo modo em relação aos outros sem que reconheça como legítima ou justa, nas mesmas circunstâncias, uma ação igual dos outros diante dele. Portanto, nesse sentido, justiça é uma relação entre dois sujeitos de tal forma que o dever de um deve correlacionar -se com o do outro.

Fonte: Nascimento, Amauri Mascaro / Nascimento, Sônia Mascaro Curso de direito do trabalho : história e teoria geral do direito do trabalho : relações individuais e coletivas do trabalho / Amauri Mascaro Nascimento. – 29. ed. – São Paulo : Saraiva, 2014.

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